sábado, 4 de dezembro de 2010
Trechos "La condition Humaine" de André Malraux-1972
Pegou na tigela de Kyo (Kyoshi=diminutivo é Kyo.). O Guarda entrou, esbofeteu o homem com toda força e saiu levando a tigela, sem uma palavra.
-Por que não me bateu êle?( A Tigela que o homem faminto pegara era para Kyo, este um japonês pequeno burguês mestiço que militava na indochina pela revolução socialista) Perguntou Kyo em voz baixa.
-Eu era o único culpado, mas não é por isso: você é político, provisório, e está bem vestido. Vai tentar obter dinheiro de você ou dos seus. Mas isso não impede...espere...
"O dinheiro persegue-me até neste covil", pensou Kyo. Tal como nas lendas, a abjeção do guarda não lhe parecia plenamente real; e, ao mesmo tempo, parecia-lhe uma imunda fatalidade como se o poder tivesse podido bastar para transformar quase todos os homens em bêstas. Os sêres obscuros que resmungavam por trás das barras(Grades de ferro), inquietantes como os crustáceos e os insetos colossais dos sonhos da sua infância, não eram mais homens que êles. solidão e humilhação totais. "Atenção", pensou, porque já se sentia mais fraco. Pareceu-lhe que, se não fôsse senhor da sua morte, encontraria ali o pavor. Abriu a fivela do cinto, meteu o cianeto no bôlso.
"...(König interrogando Kyo)
König baixou os olhos, ergueu-os de nôvo:
-Tem amor a vida?
-Depende.
-É que se pode morrer de diversas maneiras.
-Pelo menos não se pode escolher...
-Julga que se escolhe a maneira de viver?
König pensava em si mesmo. Kyo estava resolvido a nada ceder de essencial, mas não desejava de modo algum irritá-lo:
-Não sei. E o senhor?
-Disseram-me que era comunista por dignidade. É verdade?
Kyo não compreendeu, a princípio. Atento à campainha do telefone, perguntava a si mesmo o que significava êsse singular interrogatório. finalmente:
-Isso interessa-o realmente?-Perguntou.
-Mais do que julga.
Havia ameaça no tom, senão na frase. Kyo respondeu:
-Acho que o comunismo tornará a dignidade possível para aquêles com quem combato. O que é contra êle, em todo caso, obriga-os a não ter, a menos que possuam uma sabedoria tão rara entre êles como entre os outros, mais talvez, precisamente porque são pobres e o trabalho dêles os separa da vida. Por que fazer-me essa pergunta, visto que não ouve a minha resposta?
-A que chama dignidade? Isso não quer dizer nada.
O telefone tocou. "A minha vida", pensou Kyo. König não levantou o auscultador.
- É o contrário da humilhação-disse Kyo...Quando se vem de onde eu venho, isto quer dizer alguma coisa...
Pag. 259- liivro "La condition Humaine" de André Malraux- Setembro de 1972.- coleção dos "Imortais" Livros Vermelhos- editora Abril Cultural.
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